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A Ciência por trás da tipografia nos quadrinhos

- Tassiane Ribeiro (10/04/25)


Já falamos aqui no blog sobre um dos elementos primordiais das histórias em quadrinhos: os balões de fala. Vimos que eles têm uma tarefa bastante sinestésica: traduzir o som para a imagem. Os balões, assim como a tipografia, são alguns dos vários signos potentes na arte de contar histórias a partir de uma sequência de imagens. Mas você sabia que, por trás desse processo criativo, há uma ciência?

Vamos falar um pouquinho sobre a semiótica. Grosso modo, essa é uma teoria muito difundida na linguística, a partir da leitura de vários autores, mas que estuda a natureza a função dos signos. Ou seja, como eles operam o nosso pensamento. Cada indivíduo, por estar inserido em determinado contexto social, tem uma biblioteca mental de símbolos, ícones e signos. Por isso sentimos um alerta quando vemos uma placa vermelha com uma mão erguida, mesmo se nela não estiver escrito “pare”. E é por isso que, a depender da tipografia, nossa leitura pode ser diferente.

Você certamente já viu uma imagem assim por aí:


A tipografia usada altera o sentido.
A tipografia usada altera o sentido.


As letras acima passam duas mensagens bastante diferentes – e com o mesmo texto! A tipografia pode reinventar totalmente o sentido de uma mensagem, e isso tem tudo a ver com a forma como criamos semioses (significados) ao nos depararmos com determinados símbolos/signos. Por isso, o quadrinista precisa compreender não só a tipografia, mas o arranjo do texto nas páginas de quadrinho como parte essencial da narrativa.

Vejamos as onomatopeias, por exemplo. Elas são um exemplo incrível de como esse processo de semiose acontece entre o leitor e os quadrinhos. A tipografia exerce um papel crucial nesses casos, mas, junto a ela, outros símbolos também entram em cena: cores vibrantes e fumaças para indicar uma explosão, letras tremidas para indicar uma porta rangendo, etc.

A palavra-chave é essa: as tipografias indicam um significado, e nós construímos o sentido com os símbolos que já conhecemos.


Onomatopeias fazem partem da imagem transmitida nos quadrinhos.
Onomatopeias fazem partem da imagem transmitida nos quadrinhos.

Uma tipografia bem aplicada permite uma harmonia na obra, na medida em que ela pode ser lida tanto como texto quanto como imagem. Tipografias serifadas, por exemplo, passam uma ideia de seriedade, de “fato lido no jornal”. Já uma tipografia mais despojada, como a famosa Comic Sans (amada por uns, odiada por outros), está muito mais ligada ao contexto da criatividade.

Inclusive, essa “querida” tipografia foi aplicada na Microsoft justamente a partir de uma tentativa de substituir a Times New Roman no programa Microsoft Bob, que tinha uma interface toda trabalhada no desenho. A ideia era justamente passar a sensação de abrir uma HQ. Mesmo não conseguindo esse feito inicialmente, o criador incorporou a Comic Sans à Microsoft, o que popularizou o seu uso – inclusive em contextos em que uma letra “divertida”, que parece ser escrita à mão, não combina muito bem.

Comentário à parte: às vezes, a escolha cliché de uma tipografia em uma obra épica pode virar motivo de piada. Foi o que aconteceu com o uso da Papyrus em Avatar, por exemplo:


Papyrus foi a fonte utilizada na logo do filme Avatar.
Papyrus foi a fonte utilizada na logo do filme Avatar.


Letras que são lidas como imagem, não texto

O último lançamento do Rapha Pinheiro, Travessia é uma Graphic novel muda, ou seja, todas as nuances da história acontecem nas imagens. Há sim textos na história, mas não são escritos em uma língua que possamos entender – o que passa a atmosfera alienígena/ficção científica que a história explora.

Mesmo sem entendermos o que as palavras significam, conseguimos compreender o que a tipografia quer dizer. Com uma letra que se assemelha a um manuscrito, sabemos que estamos acompanhando o caderno pessoal do protagonista – um aventureiro – e essa é a associação necessária para apreciar a narrativa. Conseguimos, assim, fazer a semiose e compreender cada detalhe da obra, apenas pela associação entre os seus signos e aqueles que estão guardados em nossa biblioteca mental.


 
 
 

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